Manejo

Muito embora haja o registro que as hospitalizações e a mortalidade estejam diminuindo na maioria das regiões brasileiras7, vale observar que em paralelo o custo da asma não controlada é muito elevado para o sistema de saúde e para as famílias6, podendo comprometer mais de um quarto da renda familiar entre usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), mas esse custo pode ser significativamente reduzido focando no controle adequado da doença e em educação continuada para capacitação dos profissionais de atenção básica visando solucionar os problemas associados ao subdiagnóstico tanto da asma como de suas comorbidades6,7

 

Antes do tratamento farmacológico

 É de crucial importância que os profissionais que manejam asma conheçam os principais fatores que podem influenciar negativamente a resposta ao tratamento da asma e que devem ser rotineiramente checados3

  • Diagnóstico incorreto; 
  • Falta de adesão ao tratamento; 
  • Eventual uso de drogas que podem diminuir a resposta ao tratamento, como por exemplo: anti-inflamatórios não esteroidais e β-bloqueadores; 
  • Exposição domiciliar ou ocupacional ao tabagismo em todas as suas formas: ativo, passivo e terciário, pois piora o controle da doença, acelera a perda da função pulmonar e diminui a responsividade ao corticoide inalatório (CI). Sendo importante ressaltar que: asmáticos tabagistas (inclusive passivamente como é o caso de crianças e adolescentes) têm risco aumentado de internações e de exacerbações graves; 
  • Exposição à poeira e demais agentes alérgenos; 
  • Presença de outras comorbidades associadas;
 

Tratamento farmacológico da asma

O tratamento da asma tem por objetivo atingir e manter o controle atual da doença e prevenir riscos futuros (exacerbações, instabilidade da doença, perda acelerada da função pulmonar e efeitos adversos do tratamento)1,3,6. Isso implica em uma abordagem personalizada, incluindo, além do tratamento farmacológico, a educação do paciente, o plano de ação por escrito, o treinamento do uso do dispositivo inalatório e a revisão da técnica inalatória a cada consulta. A base do tratamento medicamentoso da asma é constituída pelo uso de CI associado ou não a um β2-agonista de longa duração (LABA)1,3,6. Esses medicamentos estão disponíveis para uso no Brasil em diversas dosagens e diferentes dispositivos inalatórios (Tabela 1). 

O tratamento de controle da asma é dividido em etapas de I a V, nas quais a dose de CI é aumentada progressivamente e/ou outros tratamentos de controle são adicionados (figuras 1 e 2)1,3,6. Sequencialmente destacar-se-á os medicamentos de controle em cada uma das etapas:  

 

Corticoide Inalatório (CI) 

A resposta ao tratamento com CI deve ser avaliada pela combinação de parâmetros clínicos e funcionais. Após a obtenção e manutenção do controle da asma por um tempo prolongado (não inferior a 3 meses), a dose do CI pode ser diminuída (step down) para uma dose mínima, objetivando sempre que possível utilizar a menor dose de manutenção para o controle da asma1,3,6, isso porque o uso de CI, como bem sabemos, pode causar efeitos adversos locais, como irritação da garganta, disfonia e candidíase oral 1,16

Aconselha-se sempre que possível, relembrar aos médicos e aos farmacêuticos dispensadores destes medicamentos, através de programas de educação e treinamentos continuados, que a utilização de doses altas de CI por tempo prolongado aumenta o risco de efeitos adversos sistêmicos, como: a redução da densidade mineral óssea, infecções respiratórias (incluindo tuberculose que é endêmica no Brasil), catarata, glaucoma e supressão do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal 1,3,6

Corticoide Inalatório

Tabela 1- Adaptada de Pizzichini MMM et al. 2020 Recomendações para o manejo da asma da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia – 2020. J Bras Pneumol. 2020 Mar 2;46(1):e20190307. 

 

Associando CI + LABA

A associação de CI com um LABA ou LABA de ultralonga duração é o tratamento de controle preferencial nas etapas III a V da asma1,3,6, ou seja, quando o tratamento com CI isolado não é suficiente para atingir e manter o controle da doença. As evidências para o uso da associação CI + LABA como tratamento de controle preferencial nas etapas III-V do tratamento da asma são muito robustas1,3,6

GUITRA
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Fig. 1- Manejo da asma em crianças com idade entre 6 e 11 anos. CO: corticoide oral; CI: corticoide inalatório; LABA: long-acting β2 agonist (β2-agonista de longa duração); e SABA: short-acting β2 agonist (β2-agonista de curta duração). Adaptado de: GINA 202317 

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Fig. -2 Manejo da asma em pacientes com idade 12 anos. CI: corticoide inalatório; LABA: long-acting β2 agonist (β2-agonista de longa duração); CO: corticoide oral; SABA: short-acting β2 agonist (β2-agonista de curta duração); e FORM: fumarato de Formoterol. Adaptada de: Gina 202317

 

Adendo: O uso da associação CI + LABA no tratamento da asma pode ser indicado em dose fixa associada a um SABA de resgate, ou ainda em dose variável com budesonida + formoterol ou beclometasona + formoterol de manutenção e resgate, usando um único inalador1,3,6

 

Manejo da asma baseado no controle

O tratamento individualizado da asma de acordo com o controle da doença, características e preferências do paciente e acesso ao tratamento, implica em consultas mais frequentes (a cada 3-6 meses) e acompanhamento regular do asmático1,3. O racional para o ajuste do tratamento da asma é obter e manter o controle da doença, além de reduzir os riscos futuros com a menor dose possível de medicação de controle, devendo para isso todo paciente contar com um plano de ação prescrito e atualizado pelo médico (a) 1,3,6

Importante: O uso de SABA por demanda (sempre associado a CI) é eficaz no alívio imediato dos sintomas e na prevenção em curto prazo dos sintomas induzidos por exercício. A frequência de uso de SABA é um dos parâmetros que definem qual tratamento de manutenção é o mais apropriado, e a redução do seu uso é uma das metas do tratamento da asma 1,3,6

Alerta: O uso excessivo de SABA (mais de 3 dispositivos no ano) está associado a um maior risco de exacerbações, e o uso de mais de 1 dispositivo no mês está associado a um maior risco de morte por asma1,3

 

Riscos associados à “asma leve”

Não se deve minimizar os riscos que pacientes com “asma aparentemente leve” de sofrer eventos adversos graves1

asma leve
  • 30-37% dos adultos com asma aguda
  • 16% dos pacientes com asma quase fatal
  • 15-20% dos adultos que morrem de asma
  • Lembre: Os gatilhos de exacerbação são imprevisíveis (vírus, pólens, poluição, má adesão)¹
 
 

Apresentaram sintomas nos 3 meses prévios ¹

 

Montelucaste

O montelucaste é um antagonista de receptores de leucotrienos que atua bloqueando a broncoconstrição e reduzindo a inflamação da via aérea. Tem efeito não inferior ao CI no controle da asma, porém seu efeito na redução das exacerbações é menor6. Muito embora o montelucaste associado ao CI está incluído como outra opção de tratamento nas etapas II a IV do GINA1,6, em março de 2020 a agência de saúde americana, Food and Drug Administration (FDA) emitiu um aviso de alerta denominado “black warning box” para o montelucaste9. Este é o aviso de maior nível de risco do FDA, e é emitido apenas quando estudos médicos indicam que o medicamento apresenta um risco significativo de efeitos adversos graves ou até mesmo fatais10. Segundo o alerta do FDA, estes eventos adversos podem incluir: agitação, incluindo agressividade de comportamento, problemas de atenção, sonhos ruins ou vívidos, depressão e pensamentos e/ou ações suicidas 9,10

 

Tiotrópio

O brometo de tiotrópio, na dose de 5 μg/dia é o único LAMA aprovado para uso no Brasil como terapia adjuvante livre para tratamento de asma para pacientes com idade > 6 anos. 

Evidências para a indicação de tiotrópio como tratamento adicional da asma moderada a grave não controlada (etapas IV e V) são oriundas de estudos randomizados controlados (ERC) em adultos e adolescentes12-14, assim como em crianças15

Em adultos com asma grave não controlada, a adição de tiotrópio aumentou significativamente a função pulmonar e diminuiu as exacerbações16. Esse efeito foi similar em dois outros estudos em adolescentes12 e crianças13 com asma grave. Em adultos, esses resultados foram independentes das características basais e dos níveis de eosinófilos e IgE sérica6.  

Seu uso está indicado como medicação adicional para asmáticos com doença não controlada que já estejam recebendo dose moderada ou alta de CI + LABA (etapa IV ou V)1,3,6. O tiotrópio mostrou ser uma droga segura quando adicionada a outros medicamentos no tratamento da asma12,6

 

Imunobiológicos

No Brasil, quatro imunobiológicos estão aprovados para uso no tratamento da asma grave (omalizumabe, mepolizumabe, benralizumabe e dupilumabe). Considerando a heterogeneidade e a complexidade da asma grave e o pressuposto de que a droga escolhida deva ser dirigida para um determinado fenótipo/endótipo (Quadro 1), essa abordagem requer experiência do especialista. Adicionalmente, o tratamento com imunobiológicos depende de diferenças no sistema local de saúde, políticas de reembolso e acessibilidade, devendo, por isso, ser conduzido pelos especialistas6.  

IMB

Quadro 1. Endotipos, fenótipos e biomarcadores. Adaptado de 6. Carvalho-Pinto RM, et al. 2021 Brazilian Thoracic Association recommendations for the management of severe asthma. J Bras Pneumol. 2021;47(6):e202102736.