Como tratar

O tratamento da FA visa à prevenção de eventos embólicos ou AVC e o controle da frequência cardíaca ou do ritmo.15

Os fármacos utilizados para a manutenção do ritmo sinusal disponíveis no Brasil são a propafenona, o sotalol e a amiodarona. Já os medicamentos utilizados para o controle da frequência cardíaca nos portadores de FA constituem estratégias importantes tanto para a prevenção de sintomas (palpitações, cansaço, redução da capacidade de exercício etc.) como para a redução da morbidade associada à doença. Entre eles, estão os betabloqueadores, os bloqueadores dos canais de cálcio não diidropiridínicos e alguns antiarrítmicos como a amiodarona e o sotalol. É fundamental para o sucesso terapêutico o controle dos fatores de risco associados que predispõem ou agravam a arritmia.15

Tratamento com anticoagulantes orais

A anticoagulação com a varfarina é realizada com alvo de INR (Razão Normatizada Internacional) entre 2 e 3. O INR é afetado por muitos fatores genéticos, alimentação, fármacos e ingestão de álcool e, assim, pode prejudicar o sucesso terapêutico e, consequentemente, necessita um monitoramento frequente dos parâmetros da coagulação. Permanecer dentro da faixa terapêutica ideal do INR é um determinante importante de proteção contra o AVC isquêmico e o risco de hemorragia.18

Com a disponibilidade de novos medicamentos anticoagulantes orais (NOACs) que não precisam de monitoramento, o tratamento desses pacientes se tornou mais fácil e seguro. Atualmente, quatro NOACs estão disponíveis no mercado para a prevenção de fenômenos tromboembólicos em pacientes portadores de FA não valvar. São os inibidores diretos do fator Xa, como a rivaroxabana, a apixabana e a edoxabana, e o inibidor do fator IIa, a dabigatrana.

O estudo RE-LY19 com a dabigatrana, o primeiro NOAC lançado no mercado, com 18.113 participantes, foi um estudo prospectivo, randomizado, de fase III, que comparou duas doses de dabigatrana (110 mg e 150 mg) duas vezes ao dia com doses ajustadas de varfarina em pacientes com FA não valvar. O desfecho primário foi AVC e embolia sistêmica (ES). Ambas as doses da dabigatrana se mostraram seguras e eficazes, quando comparadas com à varfarina. A dabigatrana na dose de 150 mg reduziu significativamente em 35% os desfechos de eficácia (AVC e ES) e em 25% o AVC isquêmico, comparada com a varfarina. Quanto à segurança, a dabigatrana nas doses de 150 mg e 110 mg reduziu significativamente o risco de sangramento intracraniano em 59% e 70%, respectivamente, e de AVC hemorrágico em 74% e 69%, respectivamente. A dabigatrana 150 mg também reduziu a mortalidade total significativamente em 15%.

Atualmente a dose recomendada da dabigatrana é de 150 mg duas vezes ao dia em pacientes com FA com idade <80 anos sem risco aumentado de sangramento (por exemplo, pontuação HAS-BLED <3) e que não estão usando concomitantemente verapamil. Nos outros pacientes, a dose recomendada é de 110 mg duas vezes ao dia. A análise post-hoc do estudo RE-LY20 dos pacientes que receberam a dose recomendada de dabigatrana mostrou benefícios clínicos mais evidentes em comparação com a varfarina. (Figura 1) Quanto à eficácia, a dabigatrana, comparada com a varfarina, reduziu significativamente o AVC e a ES em 26% e a mortalidade total em 20%; quanto à segurança, com a dabigatrana, comparada com a varfarina, houve redução significativa em 15% no sangramento maior, em 72% no sangramento intracraniano, em 28% no sangramento com risco de vida e em 14% em qualquer sangramento.

Figura 1

Outro fator que impacta na escolha do anticoagulante é o fato de que pacientes anticoagulados podem necessitar de intervenções cirúrgicas de emergência e procedimentos invasivos ou até apresentar sangramento incontrolável e/ou com risco a vida, em que o estado normal da hemostasia é imprescindível e deve ser atingida o quanto antes. Nessas situações, a dabigatrana é o único NOAC que possui um reversor específico, o idarucizumabe, que produz uma neutralização completa, imediata e sustentada da ação anticoagulante, sem efeitos prótrombóticos e possibilidade de reinício da anticoagulação em 24 horas, conforme demonstrado no estudo RE-VERSE AD.21

Figura 2A

Referências

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